Política antimanicomial do Judiciário é debatida na Ales
Comissão de Direitos Humanos abordou situação dos 54 internos com a desativação da Unidade de Custódia e Tratamento Psiquiátrico
O fechamento da Unidade de Custódia e Tratamento Psiquiátrico (UCTP), em Cariacica, foi pauta na reunião desta terça-feira (23) da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos da Assembleia Legislativa (Ales). As atividades no local deverão ser totalmente encerradas em 28 de agosto deste ano e os internos vão receber acompanhamento de medidas terapêuticas para pessoas com transtorno mental em conflito com a lei, de acordo com a avaliação de equipe multidisciplinar e o acompanhamento do sistema judiciário.
A presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos, deputada Camila Valadão (Psol), destacou o papel do Legislativo de acompanhar como esse processo vem sendo feito no estado e promover o debate adequado, evitando a desinformação, os estigmas sociais e o preconceito contra as pessoas em sofrimento psíquico.
O fim da Unidade de Custódia e Tratamento Psiquiátrico, também conhecida como manicômio judiciário, atende a Resolução 487/2023 do Conselho Nacional de Justiça, que instituiu a Política Antimanicomial do Poder Judiciário. Tal norma segue a Lei 10.216/2001, conhecida como Lei da Reforma Psiquiátrica, que estabeleceu um novo modelo de tratamento aos transtornos mentais no Brasil. De acordo com a legislação, os internos do sistema prisional com doenças mentais devem ser tratados como pacientes e não como presidiários.
Desinternação
O secretário de Estado de Justiça, Rafael Pacheco, explicou que a UCTP abriga atualmente 54 pessoas inimputáveis, ou seja, não podem ser responsabilizadas criminalmente por suas ações devido a condições psiquiátricas específicas que as impedem de compreender o caráter ilícito de seus atos. Desse total, 20 já estão em processo de desinternação. “Essas pessoas já recebem medidas terapêuticas, mas a ideia é que elas saiam dos ritos prisionais”, explicou o gestor da Sejus.
Pacheco reforçou que nenhum paciente será liberado sem laudo de equipe multidisciplinar para a desinternação. Os que não forem acolhidos pelas famílias devem ser encaminhados para residências terapêuticas ou inclusivas do estado, conforme determinado pela Sejus em conjunto com a Secretaria de Estado de Saúde (Sesa), a Secretaria de Trabalho, Assistência e Desenvolvimento Social (Setades), Secretaria de Direitos Humanos (SEDH) e acompanhado pelo Tribunal de Justiça.
“Não se trata de abertura de portões com essas pessoas saindo ao léu, sem nenhum destino. Se trata da desinternação acompanhada de forma individualizada e com responsabilidade de todos envolvidos, inclusive do Poder Judiciário, porque essas pessoas entraram com uma ordem judicial e de lá só sairão com uma ordem judicial”, concluiu Pacheco.
A secretária de Estado de Trabalho, Assistência e Desenvolvimento Social, Cyntia Grillo, reforçou a importância de seguir os dispositivos legais, incluindo a resolução do CNJ, garantindo o cuidado com os direitos, individualidade e dignidade das pessoas.
“Nós temos um grupo de trabalho constituído, com várias políticas públicas de Estado, trabalhando individualmente esses casos. Para entender qual é o equipamento, qual é o serviço público que é mais indicado e aconselhado para essas pessoas, e cuidar caso a caso, com a sua individualidade respeitada, e assim, garantir a dignidade e assegurar o direito humano dessas pessoas, com equipamento (de saúde e de assistência) digno”, completou a secretária.
A reunião ainda contou com a presença de representantes da SEDH, Defensoria Pública Estadual (DPE-ES), Ministério Público do Espírito Santo (MPES), de servidores de prefeituras da Grande Vitória, e da Associação Brasileira de Saúde Mental (Abrasme).
Desinstitucionalização
A Sesa e o Tribunal de Justiça (TJES) foram convidados para a reunião, mas não enviaram representantes. Militantes da luta antimanicomial criticaram a falta de diálogo da Sesa com a rede de saúde mental dos municípios a respeito do processo de desinstitucionalização das pessoas que estão na UCTP. Cobraram também mais envolvimento do Judiciário capixaba junto à sociedade civil e entidades que tratam da causa.
“De fato a Secretaria de Saúde precisa acompanhar e construir esse fluxo com os municípios para que a gente avance no sentido de cumprir aquilo que é a obrigação do estado do Espírito Santo, assim como todos os estados do país, que é desinstitucionalizar, acabar com os manicômios judiciários. Vamos seguir acompanhando como essas pessoas vão sair a partir de uma perspectiva do cuidado com dignidade e liberdade”, afirmou a deputada Camila Valadão.